Pedro Coutinho/OlharJuridico
Em decisão proferida nesta quarta-feira (11), a magistrada acatou pedido feito pela defesa de Fernandes, patrocinada pelos advogados Rodrigo Cyrineu e Artur Mirua, os quais sustentaram que os elementos usados como prova para embasar a Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida por Damiani careceriam de análise judicial e do contraditório para que se possam avaliar a pertinência e a materialidade dos fatos narrados.
Os juristas contestaram a veracidade dos fatos alegados por Damiani e apontaram a ausência de provas robustas. Alegaram ainda que a suspensão da diplomação violaria a soberania popular e os princípios do devido processo legal e ampla defesa.
Examinando o pedido, Emanuelle consignou que representação foi baseada em indícios ainda não confirmados pelo contraditório. Para a juíza, a apreensão de valores em espécie e as mensagens extraídas do celular do pecuarista Nei Francio, acusado de ser o mentor financeiro da campanha de Fernandes, demandam análise aprofundada durante a instrução processual, com o devido contraditório e ampla defesa.
A juíza também pontuou que jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é clara quanto à ilegalidade da suspensão da diplomação com base em indícios preliminares. “Assim sendo, constata-se que os elementos apresentados pelo representante não são suficientes para justificar a suspensão da diplomação dos eleitos”, anotou a magistrada.
Navarro Mano também lembrou que suspender a diplomação dos eleitos neste momento anteciparia indevidamente o mérito da ação, em desacordo com a jurisprudência pacífica do TSE.
Principal alvo da Operação Rustius, deflagrada na última quinta-feira (4), o agricultor Nei Francio é acusado de ser o responsável pelo setor financeiro da campanha de Alei. A ofensiva cumpriu mandado de busca e apreensão no Iphone de Francio.
Prefeitura na mira da PF
Captação irregular de recursos, uso de “laranjas” e triangulação de doações ilícitas: conversas interceptadas pela Polícia Federal revelaram indícios do suposto esquema de caixa 2 orquestrado para financiar a campanha do prefeito eleito de Sorriso.
As informações foram acostadas pelo Ministério Público Eleitoral na ação de investigação contra Alei, a qual requer que seja negada ou cassada diplomação, bem como seja declarada sua inelegibilidade.
Conforme a investigação, Nei Francio teria usado seus filhos, Alan Zibetti Francio e Ian Zibetti Francio, como “laranjas” para mascarar doações ilegais de sua empresa à Fernandes.
Conversas entre Nei e S.C.S., funcionária do setor financeiro de sua empresa, revelam que o valor de R$ 100 mil, enviado para a campanha, teria sido “esquentado” para parecer uma doação regular. Apesar de doações significativas terem sido feitas pelos filhos de Nei, não há registro de contribuições em nome dele, levantando suspeitas de que os valores, na verdade, tenham saído da pessoa jurídica da qual Nei é sócio.
Os diálogos revelam também que Nei determinava a S.C.S. que verificasse as finanças da empresa para saber quanto poderia ser doado, demonstrando que o dinheiro usado para financiar a campanha vinha da própria empresa. Em certo momento, ela sugere a reativação de uma conta poupança em nome de Nei para disfarçar a origem dos recursos.
Esse artifício reforça que as doações realizadas por seus filhos foram, de fato, oriundas de fonte vedada pela legislação eleitoral, o que pode resultar em penalidades severas, incluindo cassação do diploma do prefeito eleito.
A Polícia Federal também analisou as conversas de Francio que detalharam a existência de possível caixa 2 para cobrir despesas da campanha. Em uma conversa entre Nei Francio e P.C.L., Nei solicita R$ 100 mil para a campanha, mas a doação não aparece registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Conversas semelhantes com outros apoiadores indicam que doações foram feitas “por dentro” (declaradas) e “por fora” (não declaradas), evidenciando indícios de caixa 2. Nei e Gilson Fernandes, irmão do candidato, discutiam abertamente como ocultar essas doações para não serem detectadas.
As conversas entre Nei Francio e Gilson Fernandes, destacam a prática de disfarçar doações ilícitas como legais. Em uma das mensagens, Gilson é orientado a pagar R$ 17 mil a uma empresa de pesquisa eleitoral e seria posteriormente reembolsado com dinheiro de origem não comprovada. Em outro diálogo, Nei ordena que T. obtenha R$ 100 mil de O., preferencialmente em doação “quente”, mas aceita receber de forma irregular caso não fosse possível de outra maneira.
Em ordem proferida no final de outubro, a juíza eleitoral Emanuelle Chiaradia Navarro Mano autorizou a busca e apreensão nos dados do celular do agricultor Nei Francio, apoiador do prefeito eleito principal alvo da Operação Rustius, deflagrada na manhã desta quinta-feira (4) pela Polícia Federal. A ofensiva investiga as informações contidas no Iphone de Francio, na busca de elucidar a arrecadação de verbas irregulares e suposto Caixa 2 durante a campanha de Fernandes.
Operação foi deflagrada após Francio ser preso em flagrante pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) no dia 3 de outubro, três dias antes das eleições municipais, as quais elegeram Fernandes em Sorriso com 25.255 dos votos, ou seja, 51,33% dos votos válidos. Ele teve o apoio do atual prefeito da cidade, Ari Lafin (PSDB), e do governador Mauro Mendes (União).
Na caminhonete Hilux conduzida por Francio, os agentes rodoviários flagraram R$ 300 mil em espécie. Questionado pelos policiais, eçe não soube comprovar a origem do dinheiro, que incluía cédulas de 20, 50, 100 e 200 reais.
A PF identificou, a partir dos diálogos de Nei, que esses R$ 300 mil encontrados foram doados por uma empresa de Várzea Grande. Francio foi até a cidade industrial para buscar o envelope contendo o dinheiro. Os agentes levantaram que Atílio Rovaris seria um dos principais articuladores da campanha de Alei, e que foi ele quem solicitou que Nei buscasse a grana com pessoa identificado como Wendel, em VG.
Ao verificar o celular de Nei, a PF conseguiu identificar que o citado “envelope” foi retirado por Nei na sede da empresa L R Diesel Comércio de Peças Ltda, localizada na Rua Ministro Licínio Monteiro, 135, Jardim Glória I, Várzea Grande.
“A dinâmica dos fatos leva a crer que, na verdade, os 300 mil reais encontrados pela Polícia Rodoviária Federal no veículo de Nei foram retirados com a pessoa de Wendel, na sede da citada empresa, em Várzea Grande, durante o horário de funcionamento da mencionada empresa, com a finalidade de abastecer o caixa 2 da campanha do candidato Alei Fernandes. É consabido que a legislação eleitoral proíbe a realização de doação de pessoa jurídica a candidatos (fonte vedada), sob pena de negativa ou cassação da diplomação”, disse a PF à Justiça Eleitoral.
Segundo os autos, Francio é pai de Ian Zibetti Francio, um dos maiores doadores da campanha de Fernandes. Durante seu depoimento à PF, Francio inclusive confessou que possui “vínculo de amizade” com Alei, admitindo ter trocado mensagens com o prefeito eleito, bem como que ambos são proprietários de um pesqueiro no Pará.
Em outubro, diante do flagrante de Francio, a juíza da 43ª Zona Eleitoral de Sorriso autorizou a quebra de sigilo de dados do seu celular. Em sua decisão, a magistradas anotou que o acervo de informações anexadas no processo evidenciou a necessidade de elucidar a origem e o destino do dinheiro apreendido com o agricultor, já que ele é apoiador declarado de Fernandes e não soube explicar a origem e destino do montante.
‘Com o flagranteado foi apreendido, também, um aparelho celular, o que, aliado à quantia de dinheiro em espécie e à não comprovação da origem e, ainda, à iminência das eleições municipais, demonstra a pertinência e necessidade de se obter o extrato de dados do referido aparelho, a fim de se ter elementos fundamentais para a conclusão de eventuais crimes eleitorais. Diante das peculiaridades do caso, vez que pode haver no aparelho celular dados/informações que levem a elucidar a origem e a destinação do dinheiro apreendido, autorizo o acesso e posterior realização de Exame Pericial para análise e extração de dados”, decidiu, em outubro.
Na manhã do dia 4, então, a Polícia Federal bateu na porta de Francio com objetivo de apreender seu Iphone. Na ação, os agentes apreenderam R$ 115 mil em espécie.